terça-feira, 5 de abril de 2011

O outro

Por Marlon Vila Nova
Estranhamente ele acordou animado naquela segunda feira. Depois do final de semana agitado e uma semana tão corrida como a que tinha passado, era estranho isso acontecer. Ele mesmo já havia se preparado pra se sentir destruído na segunda feira. Mas não. Um ânimo estranho, forasteiro, tomou conta do seu dia, do seu humor, da sua rotina. Durante o final do dia, que não havia sido nada excepcional, apenas normal, como todos os outros dias em que tudo havia dado certo, durante aquela soneca habitual no metrô, quando seu relógio biológico o acordou exatamente uma estação antes da que ele tinha que descer, aconteceu o único fato que mudaria seu dia dos outros, rotineiros. Ao abrir o olho, meio de mau-humor, como sempre quando acorda, ele deu de cara com um sujeito a sua frente. O metrô estava cheio, um pouco mais que o normal. Ao olhar em volta, sentiu que o cara em frente o encarava. Ao encará-lo de volta, o outro desviou o olhar. Foi quando ele se deu conta de que ele tinha algo de interessante. E não conseguiu mais parar de olhá-lo. O cara não tinha nada de demais. Tinha a pele um pouco morena, cabelos lisos e escuros, tinha estatura mediana e era magro. Mas tinha alguma coisa no seu olhar quando cruzava acidentalmente com os dele que o hipnotizava. Os olhos do cara estavam um pouco vermelhos, e ele bocejou uma duas vezes, o que demonstrava que ele também estava cansado, provavelmente da rotina dele. Mantinha desde o início uma expressão séria na rosto, como quem está bravo com alguma coisa. A boca, carnuda, sempre fechada. Uma pequena ruga se formava na testa indicando que ele não devia estar muito feliz. De repente, depois de algumas vezes que os olhares dos dois haviam se cruzado acidentalmente, ele percebeu a ruga na testa do outro se desfazendo junto com uma sensação de que ele tentava segurar um sorriso que quase saiu. A partir daí um clima estranho mudou completamente o humor dele, mas o incomodava não saber o que significava aquilo tudo. Na hora de descer, ele se posicionou propositalmente atrás do outro, que saiu do metrô e foi direto em direção à escada rolante que ele não tinha que pegar. Ele viu o cara subir lentamente as escadas, até que lá em cima, antes de que a troca de olhares não fosse mais possível, o outro virou de costas até sumir da visão dele, encarando-o sem piscar. O segundo metrô chegou tão rápido como nunca havia chegado, e ele entrou no vagão pensando porque na vida real ele não voltava correndo descendo as escadas antes que fosse impossível encontrá-lo de novo. E, três segundos depois da porta se fechar, ele viu pelo vidro o cara descendo as escadas correndo, procurando por todos os lados. Os olhares dos dois se cruzaram uma última vez quando o trem entrou em movimento. _ Ele voltou... - Ele pensava incessantemente. _ ... tarde demais.
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