quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Meu "eu"

Por Marlon Vila Nova

Sabe quando você é criança e todos te perguntam o que vai querer ser quando crescer? Toda criança quer ser algo legal quando crescer. Eu sempre respondia que queria ser engenheiro. Meu irmão, veterinário. Uma de minhas irmãs queria ser médica, e a outra, vendedora da Avon.
Nenhum de nós é hoje o que dizia querer ser quando crescesse. Eu desisti da engenharia quando vi Física no primeiro ano. Desde então travou-se uma batalha pra enfim decidir o que eu iria ser pro resto da minha vida, já que a engenharia, tão certa pra mim até então, estava fora da jogada. De ambientalista a advogado, tudo passou pela minha cabeça. Cada semana eu queria ser algo diferente, pra desespero da minha mãe, que sempre conversava comigo calmamente e tentava me aconselhar sem me influenciar diretamente. O que ninguém nunca soube é que, era tão difícil pra mim escolher algo porque eu tinha que escolher uma profissão que seguiria por um tempo determinado. Até ser ator.
Sempre tive certeza absoluta de que seria essa a minha profissão. Mas como um pressentimento, eu sabia que tinha que optar por algo "até" eu ser ator. Por algum motivo eu sabia que isso aconteceria depois. Que eu tinha que ser alguma outra coisa antes. Então hoje eu sou esse misto de profissões. Me formei em Administração de Marketing, me especializei em dança, comecei a dar aulas de dança, de Inglês, fazer traduções, dançar, dançar, fazer aulas de canto... e esqueci que era ator desde o início, e que seria essa minha profissão. O dia que eu sabia que chegaria na minha infância estava registrado em minha memória como um dia que chegaria. E eu estava esperando que caísse do céu, diretamente no meu colo.
Um amigo de confiança me perguntou esses dias quando eu iria me focar no que eu realmente sempre quis fazer da minha vida. E eu respondi que a partir daquele momento. Voltei a estudar teatro, me apaixonar pelas possibilidades de ser mil pessoas, mil coisas, do poder de emocionar, de irritar, de fazer rir... A partir de agora, que já encontrei meu "eu" na vida, me foco agora em encontrar meu "eu" nesse mundo do teatro. Não é de forma alguma um desabafo de arrependimento, até porque esse tempo investindo em outras coisas só me acrescentaram muitos conhecimentos, e o fato de hoje saber dançar e cantar melhor só fazem de mim um artista mais completo. Cada personagem que eu viver vai me trazer mais conhecimento sobre o tipo de pessoa que aquela pessoa é, e eu, que nunca vou deixar de ser eu mesmo, vou me emprestar pra cada um deles em troca de tudo que eles tiverem pra me ensinar. Estou com fome e sede de tudo isso que está por vir. Sou de novo aquele menino que sonhou ser engenheiro sabendo que seria ator. Quem sabe eu, ator, não serei um dia um engenheiro.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

sábado, 1 de fevereiro de 2014

Amor à Vida

Por Marlon Vila Nova

Hoje a rede Globo quebrou um tabu da própria emissora e, no último capítulo de Amor à vida, exibiu o primeiro beijo gay da história das novelas da emissora. Uma cena linda que, para surpresa de muitos que esperavam comentários de repulsa, ouvia-se gritos, comemoração e até foguetes, como se o time preferido tivesse feito um gol. A cena gerou um alvoroço e foi muito elogiada, mas não foi o que mais tocou as pessoas nesse último capítulo da novela.
Como desfecho principal da trama, os personagens César e Félix, interpretados por Antônio Fagundes e Mateus Solano respectivamente, protagonizaram o que foi considerado por muitos o final mais bonito de todas as novelas já vistas. Particularmente entendo o motivo. Na cena, o filho que sempre foi claramente rejeitado pelo pai e que veio a cometer atos de intensa maldade por conta dos problemas psicológicos que essa gerou, consegue vencer uma luta interna e dizer ao pai que o ama. Em resposta, o pai - que sempre maltratava o filho em suas tentativas de demonstração afetiva - responde que também o ama. O fim da novela, com um close dos dois de mãos dadas ao som da sinfonia número cinco de Mahler, na praia, de frente pro Sol, arrancou lágrimas de grande maioria do público que assistia.
É fato que grande parte do público que assistia ao último capítulo era de gays ansiosos pelo tão esperado beijo. Por esse motivo, grande parte do público se emocionou tanto com a cena entre pai e filho. Não posso dizer por todos, mas acredito que, como eu, muitos sofrem o mesmo problema de relacionamento com seus pais. Aquilo não foi bonito só porque conhecíamos os personagens e sabíamos da dificuldade e do significado daquele gesto, mas porque conhecemos nossos próprios pais e sabemos como queríamos ouvir aquilo deles.
Era o final da minha formatura em 2005, no final da festa eu estava tão bêbado quanto meu pai. Nunca tinha dançado com ele antes, ele nunca tinha me abraçado tanto como naquele dia, nunca tinha o visto tão feliz comigo. Ele estava tão orgulhoso de mim e eu tão feliz por poder lhe proporcionar aquilo. No final da festa, eu acabei brigando com uma colega de turma e ele veio em minha defesa. Acabamos os dois chorando, abraçados. "Eu te amo, pai!", eu disse. "Eu também te amo, meu filho!", ele respondeu. E eu não parei mais de chorar até adormecer naquele dia. Não sei se ele se lembra disso. Nunca mais falamos a respeito. Tenho pra mim que ele não se lembra. E isso me faz pensar que ele provavelmente não tenha nenhuma memória dele dizendo que me ama, e nem minha dizendo que o amo.

E por isso essa cena de hoje me deixou engasgado, com um nó na garganta, que só vai sair quando eu chorar tudo de novo. E por isso tanta gente foi tocada e esse final foi tão lindo. Porque mostra duas pessoas que se amam, se aceitando, se despindo de escudos, e libertando esse amor que ficava preso, sufocando a alma. E é tão lindo ver tudo que escreveram e disseram sobre o último capítulo. E eu sei que esse sucesso todo se deve ao fato do final ter sido puro amor. E as pessoas andam muito carentes disso. Amor.
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